sábado, 8 de outubro de 2011

habito-me

Na direção contrária ou favorável sei que vou andar
Por onde vou, faço de mim o meu verdadeiro lugar

A imensidão de cada passo se revela bem depois
Sem afastar o lado bom que se apontou no coração

E na bagagem um volume bruto de afirmações
Mesmo sabendo a recaída ser possível de chegar
Mais cedo ou tarde, ruindo ilusões, virando a mesa, e a recobrar
Coragem para não ter medo de errar

E o que sobrar do turbilhão voraz que arrasta o que é fugaz
Sou eu de novo, consolidado com o desejo de passar
Descalço e nu, realizado e feito como comecei
Certo de que em meu umbigo não habita nenhum um rei

Na direção por onde vou, sou eu de novo
Levando aceso o meu coração
Consolidando a coragem de passar do turbilhão
E habitar o meu lugar na imensidão.

[j. guedes]

sexta-feira, 8 de julho de 2011

Entre o bem e o mal pulsa a humanidade.
Ninguém extrapola esses limites,
nem mesmo a presunção científica
da neutralidade axiológica.

[j. guedes]

pira-se na vida

Acordei no meu aniversário
Que ressaca, gastei o meu salário
Numa festa que tinha gente boa
E tinha otários!

pira-se na vida...

Acordei e fui pro meu trabalho
No caminho, o trânsito parado
Meu horário corre disparado

Ah ah ah ah ah
Que ressaaaaaaaca!

Tantas metas me deixam sufocado
E sem retorno ao surto inflacionário
Que revira meu bolso
Nas mãos dos salafrários

Se um dia houver revanche
Quem será o culpado?

Publicidades de multinacionais
Espalhadas por todos os lugares
Hesitei-me e comprei por mero impulso
O que nem precisava:
Mais uma cilada!

Voltei pra casa no "busu" lotado
E graúdo de desejos macabros
Pensando em tocar fogo em tudo quanto é lado!

[wladimir cazé, patrick brock, j.guedes]

quinta-feira, 5 de maio de 2011

o que você quer dizer com isso?

- Pois, Ele decidiu se casar.
- Ele é maluco!
- Por que diz isso? Você também não é casado?
- E eu disse que não sou?
- O quê? Casado?
- Não; maluco.
- Espere um pouco. Preciso entender o teor espirituoso de sua colocação. Bem, então você é casado e não é maluco, mas Ele pode ser julgado maluco por decidir se casar.
- E eu disse que não sou? Foi exatamente isso que lhe perguntei antes; não lhe disse que eu era maluco por ter casado.
- Mas a entonação que você empregou fez insinuar sobre o seu casamento.
- Engano seu. Aliás, era você que falava de casamento. Eu falava de maluquice.
- Sim, maluquice de quem casa.
- A conjugação de casamento com maluquice foi por sua conta. Você falava do casamento, enquanto eu falava Dele.
- Já me predisponho a desistir de entender tudo isso. Por favor, ligue a TV.
- Olha, que agradável! Bem no horário do programa que gosto!
- Prefiro outro canal, onde passam mentiras mais interessantes que essa.
- Trocar uma mentira por outra em nada muda. Aliás, mentira tem um efeito só. Acho desastroso demais dar importância a uma mentira que não seja de si próprio.
- Então, por que tanta euforia para dizer que gosta desse programa?
- Por causa dos intervalos. Tenho o perfil concreto de público-alvo das publicidades.
- E o mercado anda muito preocupado com verdades.
- Não procuro verdades. Eu quero me ver, só isso.
- Agora percebi a coerência. Você se prende às mentiras publicitárias, imaginando o que lhe dizem ser parte de si. E outro lá que é maluco.
- E eu disse que não sou? E ainda mais: você que trouxe mentiras para o meio da conversa!
- Se insistir mais um pouco, acabo por me acostumar com o seu complicado "não dizer que é". Salve-se quem puder.



[j. guedes]

sexta-feira, 29 de abril de 2011

*

Vultoso véu diluviano
que verte do céu!

Deflui o fôlego aflito
de quem lá fora fica,
enquanto, nas alcovas,
se salvam as almas com salmos
somados ao medo da partida.

[j. guedes]

quarta-feira, 13 de abril de 2011

batismo de capoeira

Rasteira de mestre é navalhada!

O gingador que se atreve
Já sabe que, em breve,
Ficará no chão

A perna que gira amolada
Com mira certeira
Cumpre a previsão

Se volta em gingado pra roda
Recebe outra poda
E depois pede a mão

Levanta-se com humildade o gingador
Mesurando a corda
Que rege a lição

E ganha o apodo
Que integra sua identidade
E sua vocação

D’acolá berimbau tocou
Pernada afiada no espaço ventou
No golpe que deu, fez que foi, mas voltou:
Calundu de quem vacilou!

[João Guedes]

terça-feira, 5 de abril de 2011

Lanço no ar palavras
Carregadas de emoção,
Leves para o vento
Que as leva a contento
Num lúdico balão,
A resvalar no coração:
Longe destinatário,
Mas, atilhado pela intenção
De jungi-lo ao meu ser-tão
Solit(er)ário.

[j. guedes]

segunda-feira, 21 de março de 2011

retomadas

Penso; logo, desisto.
Desavenço; logo, malquisto.
Tenso; logo, ansiolítico.
Imenso; logo, visto.
Censo; logo, estatístico.
Propenso; logo, invisto.
Venço; logo, conquisto.

[j. guedes]