quarta-feira, 30 de maio de 2007

translações


TRANSLAÇÕES

Fruto do passado
Sou eu, assim, mastigado
Entre essas cruentas engrenagens.

Inanes cinéticas morais
Que desfazem meu estado de evolução.
Sou ensinado, enquadrado,
Quase um robô, só que ainda defeco.

Sou semente irrompida para conceber família
E formar outras matilhas no trabalho, nos clubes,
A custa de um sonho incorreto, utópico.

Não sou personagem-enredo de meus anseios.
Não pude realizar meus sonhos.

Sou uma semente anômala
Que se esfacela em busca da perfeição.

Hoje sou um pesadelo concreto e animado
Por falhas de previsões.

Eu sou realmente a minha parte desconhecida.

(João Pinto Guedes – Salvador, 2000.)

segunda-feira, 28 de maio de 2007

ENGARRAFADO NA AMPULHETA



O tempo não me dá tempo
De poder aproveitar o tempo,
Pois, atrasado fico eu no tempo,
Por não seguir, a cada momento,
O tempo certo da agulha em movimento.

Rotina é fadada ao desalento
E passo a cada passo lento
Pela vida tão fugaz,
Mas que novidade sempre traz,
Mesmo sendo fora do tempo.

O amor que tenho não entendo,
Mas sei que me deixa doendo.
Devastado de agonia
Bebo o soro da poesia:
Malsão em versos de elegia.


(J. Guedes)

sábado, 26 de maio de 2007

a digressão para o lixo

O homem é o ser mais inteligente da face da Terra porque ele foi o único a inventar o lixo.

A partir dessa assertiva notadamente irônica, percebe-se que a suposta inteligência humana -aliás, presumida pelo próprio homem - cunha-se numa audácia inescrupulosa que fére catastroficamente o ciclo de reaproveitamento espontâneo de tudo aquilo que a natureza oferece para a manutenção da vida enquanto fenômeno.

Em vez de "elo perdido", arriscaria, no entanto, denominar "elo rompido", o que fez digredir o homem, através de sua inteligência presumida, de um percurso evolutivo diferente do que se tem seguido.

E quanto mais gente se junta, mais lixo é produzido. Talvez, portanto, o lixo seja conseqüência da invenção da sociedade contingencial, que permitiu aglomerar um número vultoso de indivíduos virtuosos em destrutividade.